Sírio Possenti inicia o texto apontando que uma das razões de o tema “gramática e discurso” ser difícil, é a existência de suas muitas acepções pouco semelhantes entre si. Acrescenta que é necessário ficar claro no texto sobre o que se fala. A partir da Análise do Discurso Francesa, critica formulações que deixam a desejar quanto ao estruturalismo e à mesmice do sujeito assujeitado. Usando a resenha de um argumento de Paul Henry, o autor salienta a necessidade de clareza de sentido do texto.
“[...] a liberdade de combinar fonemas em palavras é circunscrita, é limitada à situação marginal da criação de palavras”. Citando Jakobson, Possenti busca asseverar seu ponto de vista em relação ao tema discurso e gramática, percebendo que “na formação das frases a partir de palavras, a coerção que o locutor sofre é menor”. Desse modo, nega que o discurso seja uma camada, visto que este não consiste apenas em explicar características, mas também sua interpretação.
O exemplo mostra os aspectos do discurso e da gramática, imprimindo a relação de dependência ou complementariedade entre ambos. Isto porque o combinar fonemas é limitado à própria regra gramatical, todavia, na formação de frases o locutor tem liberdade de escolher como formá-las. E esse liberdade implica uma intencionalidade do discurso.
O autor estabelece a relação entre língua e discurso a partir da AD, clarificando o sentido de discurso como sendo não apenas complemento da língua, nem resultado do simples uso desta. Nesse sentido, o discurso não está em oposição à gramática nem está como seu mero complemento. O discurso é para Possenti, um tipo, um efeito de sentido que se materializa na língua, por meio de trabalho com e sobre recursos de expressão que produz efeitos de sentido. O autor ressalta, ainda, que nem sempre esses efeitos são percebidos pelo locutor, ouvinte, leitor.
Para reforçar sua visão, menciona a análise de Kress (1985), em que é abordado o discurso em uma reportagem de TV. O locutor apresenta a reportagem permeada de adjetivação, imprimindo um carregado discurso negativo em relação aos manifestantes do antiapartheid.
O primeiro repórter escolhe palavras carregadas de intencionalidade, que mostram a polícia como a protetora, como aquela que defende a sociedade da violenta manifestação que findou em muitos feridos e 13 presos. O segundo repórter afirma que os grupos contrários à excursão marcam o dia como a vergonha de Nova Zelândia.
Os três exemplos exibem a relação entre gramática e discursividade, pois “o discurso que se veicula neste texto se veicula exatamente pela seleção de determinados recursos da sintaxe”. A posição ideológica pode se dar de outras formas, por outra estrutura sintática. Sendo, portanto, cada caso um caso, é o modo como o discurso é veiculado que produz sentido e\ou sua interpretação.
Evanilde Miranda
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